O número de mortes por acidentes de motocicleta manteve-se estável no Estado de São Paulo, em 2009. Há seis anos esse indicador crescia continuamente em trajetória oposta à dos óbitos provocados por acidentes com os demais veículos e por atropelamentos, ambos em declínio. Esses resultados foram apurados com base no Sistema de Estatísticas Vitais (SEV), mantido pela Fundação Seade com as informações envia- das mensalmente pelos Cartórios de Registro Civil.
Tais informações, oriundas do registro civil e da declaração de óbito, dis- tinguem-se das registradas pelas instituições policiais e de transportes, que geralmente contabilizam as mortes ocorridas no local do acidente. As informações do SEV, aqui utilizadas, consideram os óbitos, segundo local de residência, provocados pelos acidentes com motocicletas, em que a vítima é o condutor ou o passageiro, inclusive quando as mortes ocorrem em pronto-socorros ou hospitais.
Convém, de início, situar o Estado de São Paulo no contexto nacional. To- mando 2008 como referência – último ano com informações disponíveis para todos os Estados1, São Paulo é uma das Unidades da Federação com menores taxas de mortalidade por acidentes de motocicleta. Ordenando-as da maior para a menor, São Paulo aparece em 21º lugar. A taxa de mortalidade do Brasil foi de 4,7 óbitos por 100 mil habitantes, em comparação à de 3,4 por 100 mil, em São Paulo. Em contraste, a situação foi mais grave em Roraima, Tocantins, Piauí e Mato Grosso, cujas taxas superavam 10,0 óbitos por 100 mil habitantes. Entre as poucas UFs com situação mais favorável que São Paulo encontram-se Bahia, Acre e Amapá, cujos indicadores não chegavam a 2,0 óbitos por 100 mil habitantes. Mesmo assim, a situação paulista é motivo de preocupação, uma vez que, por seu porte populacional, o Estado concentra 15% das vítimas fatais de acidentes com motocicleta registrados no país.
Evolução recente da mortalidade por acidentes de motocicleta em São Paulo
Em 2002, a taxa de mortalidade por acidentes de motocicleta era de 1,03 óbito por 100 mil habitantes no Estado de São Paulo. Desde então, esse indicador cresceu continuamente, até atingir seu ponto máximo em 2008 (3,43 óbitos por 100 mil), 3,3 vezes maior que o registrado no ano inicial da série. Entretanto, essa trajetória apresentou súbita interrupção em 2009, quando a taxa de mortalidade por acidentes de motocicleta foi de 3,40 óbitos por 100 mil habitantes (Gráfico 1).
O número de óbitos provocados por acidentes de motocicleta tem estrei- ta relação com o tamanho da frota desse tipo de veículo no Estado de São Paulo (Gráfico 1). O número de motocicletas circulando no Estado cresceu mais de três vezes, entre 2002 e 2009, quando chegou a 3,4 milhões. Entretanto, mesmo com o crescimento da frota de motocicletas, em 2009 não se elevou o número de óbitos provocados por acidentes com esse tipo de veículo.
Gráfico 1
Taxas de mortalidade por acidentes de motocicleta e frota de motocicletas e assemelhados
Estado de São Paulo – 2002-2010 (1)
Fonte: Fundação Seade; Detran-SP (www.detran.sp.gov.br/frota/frota_jan.asp).
(1) Em janeiro de cada ano.
Ainda é prematuro afirmar que houve reversão da tendência das fatalidades decorrentes desse tipo de acidente, mas algumas explicações para a mudança de seu comportamento em 2009 podem ser buscadas nas medidas legais implantadas em 2008. Entre elas, destacam-se a Resolução 270 do Contran, que alterou a Resolução 203 de 2006 e regulamentou o uso de capacetes pelos motociclistas e seus acompanhantes, e a Lei 11.705, chamada de Lei Seca, que modificou o Código de Trânsito Brasileiro, restringindo ainda mais os limites de consumo de bebida alcoólica pelos condutores de veículos.
Visão regional
A Região Metropolitana de São Paulo registrou o maior número de óbitos provocados por acidentes com motocicletas (44% do total estadual em 2009), como era de se esperar, pelo volume populacional da região. Entretanto, o relacionamento do número de mortes com a população resulta em 3,15 óbitos por 100 mil habitantes, em 2009, taxa de mortalidade por acidentes com motocicleta inferior à média do Estado (3,40 óbitos por 100 mil habitantes) e uma das menores quando comparada com as demais regiões metropolitanas e administrativas paulistas (Tabela 1).
Tabela 1
Taxas de mortalidade por acidente de motocicleta e crescimento anual
Estado de São Paulo – 2008-2009
Regiões Administrativas | Taxas de mortalidade (por 100 mil habitantes) |
Crescimento (%) | |
2008 | 2009 | ||
ESTADO DE SÃO PAULO | 3,43 | 3,40 | -0,88 |
Regiões Metropolitanas | |||
Região Metropolitana de São Paulo | 3,10 | 3,15 | 1,69 |
Região Metropolitana de Campinas | 5,87 | 4,41 | -24,81 |
Região Metropolitana da Baixada Santista | 3,64 | 3,29 | -9,60 |
Regiões Administrativas | |||
Araçatuba | 2,91 | 3,29 | 13,23 |
Barretos | 4,59 | 4,32 | -5,84 |
Bauru | 2,42 | 2,78 | 14,85 |
Campinas | 4,33 | 3,68 | -15,03 |
Central | 5,37 | 4,25 | -20,87 |
Franca | 3,76 | 3,43 | -8,60 |
Marília | 5,17 | 4,71 | -8,88 |
Presidente Prudente | 4,49 | 3,50 | -22,08 |
Registro | 3,73 | 3,35 | -10,15 |
Ribeirão Preto | 4,31 | 5,38 | 24,84 |
São José do Rio Preto | 2,63 | 3,31 | 25,72 |
São José dos Campos | 1,77 | 1,66 | -6,35 |
Sorocaba | 3,59 | 4,38 | 21,86 |
Fonte: Fundação Seade.
Entre as regiões, a situação mais grave foi a da RA de Ribeirão Preto, que superou 5 óbitos por 100 mil habitantes, seguida pelas RAs de Marília, Sorocaba, Barretos e Central e pela Região Metropolitana de Campinas, cujas taxas de mortalidade por acidente de motocicleta foram superiores a 4 óbitos por 100 mil habitantes em 2009.
A despeito desses valores, na maioria das regiões paulistas o indica- dor estabilizou-se ou reduziu-se entre 2008 e 2009. Os exemplos mais destacados foram a RM de Campinas e as RAs Central e de Presidente Prudente, cujas reduções superaram 20%. Na RMSP, a taxa de mortalidade por acidente de motocicleta manteve-se praticamente estabilizada (passou de 3,10 para 3,15 óbitos por 100 mil habitantes). Entretanto, nas regiões onde houve crescimento, este se deu de forma bastante intensa, como nas RAs de São José do Rio Preto, Ribeirão Preto e Sorocaba, cujos aumentos superaram 20% (Tabela 1).
Características das vítimas
Além dessas informações gerais sobre o tema, o SEV também permite identificar quais grupos populacionais são mais atingidos por acidentes de motocicleta. Em 2009, entre as vítimas fatais desses acidentes predo- minam os homens, principalmente os jovens (Gráfico 2).
Gráfico 2
Taxas de mortalidade por acidente de motocicleta, por faixa etária, segundo sexo
Estado de São Paulo – 2009
Fonte: Fundação Seade.
A mortalidade por acidentes de motocicleta passa a ser relevante, para homens e mulheres, na faixa etária entre 18 e 19 anos, que corresponde à idade em que se obtém o documento de habilitação (Gráfico 2). Para as mulheres, a taxa de mortalidade se eleva na faixa etária seguinte (20 a 24 anos), em que atinge seu ponto máximo. Já entre os homens, os coeficientes de mortalidade aumentam intensamente entre 20 a 24 anos de idade, triplicando o índice em relação ao grupo etário anterior. A partir dessa faixa etária, os coeficientes diminuem paulatinamente, mas sempre se mantêm em níveis bem superiores aos das mulheres nas faixas etárias correspondentes.
Outra característica importante dos acidentes fatais de motocicleta, e que tem sido motivo de debate tanto na mídia como nos estudos sobre tais acidentes, diz respeito às vítimas que utilizam o veículo como ferramenta de trabalho, ou seja, os motoboys. Embora não seja possível identificar essa categoria profissional no SEV, em trabalho de investigação que vinculou as bases da Fundação Seade com as da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo foi possível constatar que, na capital paulista, cerca de 20% das vítimas fatais eram motoboys, enquanto nos demais grupos profissionais essa proporção não chegou a 5%. Assim, mudanças na legislação sobre as condições de trabalho dessas pessoas também podem contribuir para a redução do número de vítima desses acidentes.
Comentários finais
Em síntese, apesar do recrudescimento da mortalidade por acidentes de motocicleta ao longo dos anos, em 2009 houve estagnação em seus índices, possivelmente como reflexo das novas iniciativas legais implementadas em 2008. Ainda que nem o Estado de São Paulo, no contexto nacional, nem a RMSP, no contexto estadual, sejam as áreas com maio- res taxas de mortalidade por essa causa, o número absoluto de vítimas é muito elevado. Além disso, essas pessoas são, sobretudo, jovens entre 18 e 29 anos de idade, no auge de sua capacidade produtiva, em sua maioria solteiros ou com famílias recém-constituídas. A perda dessas vi- das representa não só ônus econômico, mas também perda na qualidade de vida de familiares, amigos e daqueles que sobreviveram a tais acidentes e ficaram com algum tipo de sequela física ou emocional.
Espera-se que as informações apresentadas possam contribuir para o planejamento de ações na área de transporte e na regulamentação do trânsito e das atividades trabalhistas desses jovens, de modo que a mu- dança da trajetória dessas estatísticas, observada em 2009, possa se aprofundar nos anos vindouros, com a diminuição progressiva desses óbitos, precoces e evitáveis.